sexta-feira, 5 de outubro de 2012




       Pétala por pétala,como brincadeira de infância. Um pseudo-romantismo que nos acompanha ,mesmo a vida dizendo que não. Assim foi descartando ao chão, página por página das tantas cartas guardadas e nunca remetidas. Há quanto tempo as guardava? Já havia perdido os anos, o tempo, as lembranças reais e as cartas permaneciam ali.
     Mas sempre há um tempo para tudo.Hoje resolvera esvaziar a alma.Como se pudera, mas mesmo assim a intenção ajudava a suportar o vazio.
     No final de uma das cartas ,uma frase de Oscar Wilde:" O segredo da vida está na arte."
     A vida, assim ,realmente perde todo o sentido,não há caminhos ,apenas o agora. Será tudo isto ,o que há por vir? Toda esta imensidão de abismos?
    Não pode aceitar e ao mesmo tempo conforma-se de uma maneira que ela mesma se assombra vez por outra quando um feixe de lucidez a invade. Mas nada permanece,nem mesmo a lucidez.Tudo retorna a seu lugar , a sua ordem cíclica, ao seu escuro.
   Volta para suas lembranças,não as quer resgatar ,apenas preencher um pouco o vazio que a vida foi cavando dia após dia, devagarinho como se esculpisse a dor.
   Vazios não se preenchem se não seguramos as rédeas da  própria vida com as nossas mãos. É pura ilusão, não pertencermos e acharmos que um outro alguém possa preencher nossos abismos e inquietações. Somos os autores,os protagonistas os sabotadores. Precisamos assumir, rasgar as cartas e as pétalas e encarar a vida.
                                                          Vida ...ou Arte?

                      " As terríveis experiências da vida fazem-nos pensar se o seu protagonista não é,ele mesmo,algo de terrível." Nietzsche


Todas as janelas abertas. Sentia-se sufocando. As pessoas, do outro lado da janela ,movimentavam-se como se nada as sufocassem. Ele estava ali ,imóvel,desde que havia chegado.Da onde mesmo chegara? Para onde ía? Ou melhor,para onde queria ir?
Sobrevivendo,sentia-se seguro assim.Em total estado de" sobrevivência". Alguns fragmentos de vida,apenas ,nada além de fragmentos.O futuro é algo que não existe,o medo o dissipa.O passado ,melhor não tentar resgatá-lo e o presente é isto.
De repente, lhe vem à memória , a lembrança de um encontro.Um apenas, vivido com a alma inteira. Talvez a única lembrança onde não foi metade.Onde reconhecer-se em cada palavra é bem mais do que uma vida repleta de encontros vazios. Lembra do olhar,do sorriso,do jeito único que tinha de contar histórias.A vida foi mais.E valeu a pena.
Procura alguma janela a mais para abrir....precisa de ar...sente que lhe falta...caminha rapidamente...abre a última janela...fecha os olhos ...a imagem dela dissipa-se. Conseguiu mais uma vez,o ar volta pouco a pouco.